domingo, maio 19, 2024
Belo Horizonte

Multimidialidade na prática 

Como os jornalistas utilizam de elementos de mídia para comunicar de forma precisa suas matérias

A forma de se fazer jornalismo não é a mesma de anos atrás, isso é um fato, com o avanço dos meios de comunicação, o jornalismo tem evoluído e usado de recursos não antes utilizados. Historicamente, o jornalismo impresso, era composto por texto, ao passar do tempo, foram introduzindo-se imagens, mas por muito tempo, a informação não extrapolava as linhas do papel.

Créditos: reprodução de imagem de Freepik

Depois disso, houve a chegada do rádio, TV, blogs, sites, redes sociais, e uma infinidade de possibilidades de veiculação de informação. Dado ao fato de que a informação busca ser sempre o mais clara para o seu interlocutor, quanto mais formas de comunicar um único assunto, melhor é. 

Quando a vontade de se fazer entendido se encontra com as múltiplas formas de vincular a informação, temos a multimedialidade. A real definição de multimedialidade, se esbarra em algumas especificidades que dificultam chegarmos de fato em um conceito concreto, (Jankowski & Hansen, 1996; Opgenhaffen, 2008; Scolari, 2008) descrevem de várias formas o conceito (Armañanzas et al., 1996; Cebrián Herreros, 2005) mas podemos considerar que o termo significa combinar distintos meios para comunicar algo, embora seja uma forma de entender o conceito, podemos considerá-lo muito além dessa pequena linha que o define. 

Dentro da definição de multimedialidade foi construído o conceito de mais três ramificações, são elas, multimédia como polivalência; que trata do desempenho do jornalista em várias funções dentro da redação, desde a criação da pauta, a edição e a cobertura. Multimédia como multiplataforma; isso acontece quando diferentes meios de comunicação trabalham em conjunto para propagar a mesma notícia. E por último, multimédia como combinação de linguagens, esse conceito é mais conhecido e mais palpável para o receptor da notícia, ele compreende a junção de textos, sons, imagens e vídeos dentro de uma única matéria. 

Na prática a construção de um produto jornalístico coeso que explora diversas mídias pode ser um desafio para os jornalistas da atualidade, com a chegada da web e anos depois com as redes sociais e plataformas que conseguem comportar a junção de várias médias, os jornalistas que utilizam apenas textos e imagens em suas matérias, se viram em um playground da multimidialidade. Fato é que o jornalista que deseja transmitir uma notícia completa, precisa que o seu conhecimento, extrapole a fronteira textual, é necessário compreender imagens, gráficos, sons, vídeos, e toda a infinidade de formas que podem ser usadas para compor uma matéria. 

No seu perfil do TikTok, a estudante de jornalismo, Ana Luiza Pereira, dá dicas práticas sobre o jornalismo e rotinas da profissão. Em seu último vídeo publicado, a jovem de 22 anos entrou na onda da mais nova trend de vídeos da internet e compartilhou dicas de como utilizar os elementos multimídia de forma coesa em um texto jornalístico. 

No livro “Webjornalismo, 7 caraterísticas que marcam a diferença”, o autor do capítulo, Multimedialidade: Informar para os 5 sentidos, Ramón Salaverría, destaca como principais elementos de utilização; texto, fotografia, gráficos, vídeos, animação digital, iconografia e ilustração, discurso oral, música e efeitos sonoros e vibração como as oito formas de utilização para a construção de conteúdos multimídias e quais sentidos humanos as recebem. Além disso, o autor também prevê alguns elementos que podem vir a ser utilizados no futuro e que atingirão sentidos geralmente não ativados por um produto multimidiático, como o olfato e o paladar. Confira a relação analisada por Salaverría:

Fonte: Ramón Salaverría

O autor aponta uma evolução dos produtos midiáticos incorporados em um texto  de cunho jornalístico e que há a possibilidade de novas ferramentas serem incorporadas às matérias em um futuro não distante. Um exemplo de crescimento acelerado das novas ideias de artefatos que visam facilitar esse trabalho é a Inteligência Artificial. Quando o texto citado foi escrito, 10 anos atrás, a utilização desta tecnologia ainda não era tão difundida. Hoje, em 2024, já poderíamos incluir a utilização de IA não propriamente como multimídia, mas como a criação de mídia através da elaboração de imagens e vídeos específicas feitas por prompt.

A composição de uma matéria multimidiática

Com a apresentação de todos os elementos midiáticos que tornam um simples texto jornalístico algo mais multifacetado, é necessário que o jornalista saiba como utilizar todos esses recursos ao seu favor. Para que a matéria não seja apenas um amontoado de informações, Ramón Salaverría destaca os critérios de composição como uma chave de uma boa interligação.

Os ‘ingredientes multimídia’ devem estar interligados no sentido de evitar a competição entre eles e de, por outro lado, oferecer um resultado positivo e coordenado. Porém, esta é uma tarefa bem mais complicada do que aquilo que parece

(Salaverría, 2014, p.40)

Os critérios de composição listados pelo autor espanhol são: compatibilidade, complementaridade, ausência de redundância, hierarquização, ponderação e adaptação.

  • Compatibilidade: O desenvolvimento correto da linguagem multimídia envolve a combinação de elementos compatíveis entre si, como fotografia e texto, vídeo e texto, entre outros. O ideal é que todo o público seja capaz de acompanhar simultaneamente os aspectos linguísticos orais e textuais aplicados na matéria.
  • Complementaridade: Quando jornalistas criam conteúdo multimídia, é crucial garantir que os elementos utilizados sejam compatíveis e se complementem. Isso é alcançado através da homogeneidade temática e da extensão das ferramentas. Todos os componentes devem abordar o mesmo assunto e ter extensões proporcionais, evitando sobrecarregar os espectadores. 
  • Ausência de redundância: A otimização é um aspecto muito importante em um texto jornalístico. Para isso, é essencial evitar redundância entre elementos de texto, áudio, imagens e vídeo. Embora uma certa repetição possa ser útil para coesão, o excesso entedia o leitor. No entanto, exceções podem ocorrer em casos específicos, como gravações de áudio de má qualidade, onde adicionar um texto transcrito é útil. A regra geral é que cada elemento deve agregar valor único. Em caso contrário, não deve ser usado.
  • Hierarquização: Para a eficácia da multimídia é necessário hierarquizar bem os elementos utilizados. Isso significa dar destaque a ferramenta que melhor transmite a essência da informação, como uma imagem impactante ou um vídeo esclarecedor, podendo dispensar explicações textuais. No entanto, hierarquizar não significa eliminar outros elementos, mas sim determinar a linguagem mais adequada para transmitir o conteúdo.
  • Ponderação: Ao criar informações multimídia, os autores devem considerar as limitações dos usuários, como tempo, espaço, largura de banda e disponibilidade de aplicativos para visualização. Embora a internet pareça ilimitada em conteúdo, os usuários têm restrições de tempo e atenção. Portanto, é essencial exercer moderação na quantidade de informação fornecida, estruturando-a em camadas para diferentes níveis de interesse e detalhamento. Isso permite que os usuários acessem informações básicas ou mais detalhadas de acordo com suas necessidades e disponibilidade de tempo.
  • Adaptação: Informações jornalísticas multimídia geralmente são parte de publicações digitais, sujeitas a parâmetros formais determinados pela arquitetura hipertextual e estilo da publicação. Isso inclui uso de tipografias específicas, ajuste às dimensões espaciais, paletas de cores e padrões de navegação sequencial. A adaptação a esses parâmetros facilita a recepção eficiente pelos usuários, familiarizando-os com a navegação padrão e garantindo uma experiência coesa.

Depois de identificar e descrever os elementos multimídia e seus critérios de composição, é importante definir como esses elementos serão montados para criar o produto final. O autor do capítulo dois do livro compara esta ação à forma como as palavras se organizam para formar frases na língua. 

Assim como em um idioma, onde diferentes tipos de palavras se juntam em frases seguindo regras gramaticais, na comunicação multimídia, os elementos são unidades de informação que se organizam seguindo o que Salaverría chama de sintaxe multimídia. 

A multimidialidade é uma importante ferramenta que agrega ainda mais valor a um simples texto jornalístico. É necessário que a utilização dos elementos sejam precisas para que o produto final seja coerente, além de completo. É como montar as peças de um quebra-cabeça para contar uma história ou transmitir uma mensagem de forma clara e eficaz ao mesmo tempo.

Acompanhe no podcast a seguir, uma entrevista com a jornalista Gabriela Sales, em um bate-papo sobre multimidialidade, na prática. 

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