domingo, maio 19, 2024
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O carnaval de Belo Horizonte como ato político 

O Carnaval de Belo Horizonte como ato político: uma análise da influência cultural e social

Thaís Frade

O carnaval na Capital Mineira tem se tornado, nos últimos anos, um dos maiores e mais influentes de todo o país. Em última pesquisa realizada pela Booking, em fevereiro de 2023, o carnaval de Belo Horizonte foi considerado o quinto maior do Brasil, com blocos que arrastam mais de um milhão de pessoas pelas ruas de toda a cidade.

Mas o que pouco se sabe sobre o carnaval de Belo Horizonte é que, na realidade, ele é um ato político, de muita luta e resistência, e vamos explicar como tudo isso aconteceu.

Praia da Estação

O Carnaval de Belo Horizonte começa por aqui. O movimento Praia da Estação, que teve início há cerca de 12 anos, é o grande pioneiro da história do carnaval na capital.

O coletivo Praia da Estação começou em  dezembro de 2009, após um grupo de jovens criar um blog na internet para questionar a maneira como as pessoas ocupavam o espaço público da capital, naquele momento, o então prefeito de BH, Márcio Lacerda, assinou um decreto que proibia a realização de eventos de qualquer natureza na Praça da Estação. 

Como conta Jana Cruz, que fez parte da liderança do movimento: “O prefeito receber o movimento, significa alguém que estava mexendo com a cidade mesmo, saiu na imprensa, viralizou na internet, saiu na National Geographic, na época. Então virou uma coisa que era bonita de se ver também. E aí virou uma tradição da cidade. Eu acho que a praia acontece até hoje. Ela foi tomando outro corpo, virando outras coisas. Começou a ser uma Praia da Estação no espaço cultural e de encontro mesmo, porque aí depois o prefeito caiu com o decreto e a praia não acabou por conta disso”, disse Jana.

Praia da estação 2019- Reprodução/ Redes Sociais

O que de fato acontecia é que a cidade não estava preparada para receber esses eventos, não tinha policiamento e muito menos infraestrutura, e o carnaval de Belo Horizonte começou a se tornar um movimento de ato político, como ressalta Jana: “E ainda a prefeitura, os bares ainda não estavam acostumados com o carnaval. Então, a polícia indo atrás da gente, teve blocos que a polícia bateu em folião, você ia entrar no metrô, não deixavam você entrar porque você estava fantasiado. Foi um período muito interessante,muito forte na cidade, porque é isso. Aí, de repente, o pessoal do teatro precisava do amplificador, aí sonava a galera da música. Rolou essa junção e essa troca maravilhosa na cidade. E assim, aí a criatividade transbordando nos próximos anos”.

O que não dá para negar é que o carnaval em Belo Horizonte vem como um ato político, essa continuação da praia, de ocupar a cidade, de lutar pelos espaços públicos, de lutar pelos eventos públicos e lutar por políticas culturais que ocupassem espaços públicos, que tivessem mais eventos gratuitos na rua e tudo mais. 

“Então é bem bonita essa história e nem todo mundo sabe que é assim, e que o carnaval de Belo Horizonte, ele iniciou de uma forma política forte, sabe? Mas é isso mesmo,” afirma Jana.

Da Praça da Estação até a Savassi

O carnaval de Belo Horizonte é uma maratona entre ruas e avenidas, começando do baixo centro e subindo rumo a Savassi ou vice e versa. A ocupação desses espaços durante a festa é marcada por muita diversidade e festividade. 

Hoje, com cerca de 375 blocos de rua e um cenário muito diferente de 13 anos atrás, o carnaval de Belo Horizonte conta com incentivos milionários e uma série de patrocinadores em busca de visibilidade. 

Um dos principais blocos do Carnaval em BH atualmente é o “Quando Come se Lambuza”, que desfila tradicionalmente aos sábados, desde 2014, na Avenida Afonso Pena. Em 2023, o bloco contou com a estimativa de 400 mil pessoas, ocupando uma das mais tradicionais da cidade e pretende aumentar o número de pessoas para o próximo ano.

André Melado, vulgo “ Melado”, é o fundador do bloco que foi criado em comemoração ao aniversário dele que também é mestre de bateria. Em entrevista sobre a importância do bloco para o carnaval, ele destaca o despertar da juventude de BH através do bloco: “O Quando Come representa a união e o despertar da juventude de BH, que nada tem a ver com idade, mas sim com atitude! O Quando Come tem como missão propagar diversão como forma trazer alegria a todos que cruzarem seu caminho, então representa também diversidade”, afirma Melado.” Afirma, Melado.

Sobre entender o Carnaval de Beagá como ato politico, Melado entende que a cidade vem sendo ocupada de maneira que mutias bandeiras estão sendo levantadas: “O carnaval de BH tem sido uma ocupação cada vez mais ordenada da cidade, com possibilidade de levantar bandeiras, propagar ideologias e manifestar a cidadania. Passando pelos organizadores de bloco, agentes públicos, comerciantes, demais profissionais envolvidos, moradores dos bairros com ou sem festa, aos foliões, todo ato pode ser considerado político, desde o uso do poder de influência, ao comportamento cidadão em respeito às pessoas, ao patrimônio e ao meio ambiente.”

Arrastando multidões pela Avenida Brasil

Já o bloco Funk You, que foi considerado o bloco de maior multidão no último carnaval, tem sua história marcada por lutas contra o preconceito. O próprio nome do bloco é por si só sinônimo de luta contra o preconceito sobre o Funk. Que embora seja considerado patrimônio imaterial do Brasil, o estilo musical carrega um peso de ser um movimento marginalizado e descriminado por muitas classes sociais no Brasil.

Entretanto, na contramão de tudo isso, o Funk You tem cada vez mais mostrado sua força. Em entrevista, o fundador do bloco, Lucas Moraes destaca como surgiu a vontade de criar um bloco que representasse o Funk trazendo um tom carnavalesco, através das baterias:

 “O Bloco surgiu da vontade de ver o repertório de funk sendo executado com uma bateria de escola de samba, trazer as batidas de funk para esse batuque orgânico, essa brasilidade, era algo que eu tinha vontade de ver e como não tinha nenhum outro Bloco fazendo isso na cidade, os próprios amigos para quem eu revelei essa ideia, me encorajaram a montar o Bloco”, como conta Lucas.

Desfile Bloco Funk You 2023 – Reprodução/ Redes Sociais

Hoje, existem alguns outros blocos que fazem essa mescla de estilos musicais, mas o “Funk You” abriu as portas para que isso pudesse ser visto da forma mais natural possível, além do mais, continua sendo o único bloco exclusivamente de fãs : “Um Bloco diferente de tudo que tinha na cidade na época e ainda continua inédito como um Bloco exclusivamente de fãs, e isso que está levando a gente a conseguir coisas grandiosas também, o fato de a gente ter feito algo diferente e levar a sério” Afirma, Lucas.

Belo Horizonte é hoje um dos maiores carnavais de rua do País, fruto de muita luta. O  carnaval feito do povo, pelo povo e para o povo. Um verdadeiro ato político.

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